Orar no monte: algo que com certeza eu e você já fizemos. Se você é crente e nunca fez, é certamente uma exceção no cenário evangélico brasileiro. Muitos de nossos irmãos, mormente os pentecostais, têm o hábito de buscar a Deus e fazer suas orações no monte (às vezes, realmente monte; noutras, creio que na maioria, meramente o que popularmente se chama de “o meio do mato”).
Antes de prosseguir, gostaria de dizer que considero esta uma prática cristã e válida (o próprio Jesus e os apóstolos são exemplos disso). Não tenho nada contra os irmãos que a praticam – eu, inclusive, cresci no meio deles – mas certamente há algumas questões a serem levadas em conta.
O hábito de reunir a igreja ou um grupo qualquer de pessoas para se dedicar à prática da oração é algo louvável. Igualmente, considero que se isolar para estar a sós com Deus é importante e até necessário. Porém, existem três pontos que, a meu ver como cristão, segundo a percepção que tenho do Evangelho, estão clara e terrivelmente equivocados. Vejamos:
1) O QUE VOCÊ VAI FAZER NO MONTE – Sejamos sinceros, você nunca ou raramente viu alguém indo ao monte pura e simplesmente para ter um relacionamento mais íntimo com Deus. Geralmente vemos pessoas buscando “poder” (uma espécie de coisa mística que te transforma num supercrente) ou ver a “glória de Deus” (basicamente, ver graveto acender e coisas do tipo), além, é claro, de às vezes estarem buscando algo de Deus, e acharem que a oração não terá o mesmo efeito se pedirem no próprio quarto, ou no momento de oração na igreja. Isso é claramente fruto do legalismo, o sistema onde alcançamos as bênçãos das mãos do Senhor por esforço e merecimento, não pela graça.
2) MISTICISMO E SOLO SAGRADO – Quem nunca viu aquela cena onde várias pessoas fazem uma roda e pedem perdão a Deus numa espécie de “conserto”, para só então entrarem no local de oração (que, como já disse, às vezes é só mato)? É uma lenda urbana propagada entre alguns irmãos de que o monte, floresta ou matagal em questão é terra santa, e como tal, deve ser pisada por pés santos, sob pena de punição de Deus.
Primeiro, Deus exige santidade em toda a nossa vida, não somente no momento de entrarmos em algum lugar “sagrado” (como no Antigo Testamento). Isso nem mesmo chega a ser santidade.
Segundo, a exegese que se faz da passagem de Moisés no monte Horebe em Êxodo 3 é péssima. Este texto está inserido no contexto do Antigo Testamento, por isso aquele solo era sagrado; além disso, era sagrado por causa da presença de Deus, não por causa de alguma coisa própria dele. Muito menos devemos crer que era sagrado por ser um monte. Ainda que fosse, deveríamos distorcer muito a Bíblia para afirmarmos que isto se aplica a todos os montes do mundo, e ainda a todos os matagais e florestas declarados montes por muitos de nossos irmãos.
Terceiro, não existe solo sagrado. É só lermos a Bíblia e veremos lugares nos quais devemos ter reverência, como o local de culto, mas nunca terreno santo, como é feito com o monte. Ninguém é castigado por pisar na igreja em pecado, muito menos será castigado por pisar nesta condição em um lugar livre da natureza.
Esta prática é chamada de misticismo, que é o que fazemos quando conferimos o título de sagrado, milagroso ou poderoso a objetos ou, no nosso caso, lugares; é a mesmíssima coisa que se faz com rosa ungida, água benta e afins.
3) SINAL DE ESPIRITUALIDADE – Obviamente, não está formalmente escrito em lugar nenhum (pelo menos eu espero) que crente pra ser crente tem que ir ao monte. Se estiver, eu serei o primeiro a ser declarado incrédulo, frio e carnal, pois pessoalmente não vou ao meio do dato de madrugada de jeito nenhum. Mas apesar de não ser formal, por muitas vezes está implícita a ideia de que quem não tem esse hábito não é tão maduro ou desenvolvido espiritualmente.
Logicamente, quem é espiritual é quem anda de acordo com o Evangelho e demonstra em seu modo de viver o fruto do Espírito de que nos fala o Apóstolo Paulo em Gálatas 5. Qualquer condição para ser considerado como cristão genuíno que esteja além deste Evangelho é pura balela, incluindo a condição de orar no monte.
Resumindo, se você costuma ir ao monte para orar, faça-o pelos motivos certos, busque sinceramente um relacionamento com Deus e não julgue os outros por não serem como você.
Que o Espírito Santo nos guie em nossa jornada.
Nenhum comentário:
Postar um comentário